Erveson Coelho

Quem sofre de Autismo tem direito ao BPC/LOAS?

Fui diagnosticado com autismo. Possuo direito ao recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BPC-LOAS)?

Como já sabemos, o Benefício de Prestação Continuada – BPC, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, é a garantia de um salário-mínimo por mês ao idoso com idade igual ou superior a 65 anos ou à pessoa com deficiência de qualquer idade.

A deficiência é entendida como condição capaz de causar impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (com efeitos por pelo menos 2 anos), que impossibilite o indivíduo de participar de forma plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.

Pois bem.

É possível sim ter acesso ao BPC/LOAS, caso você seja acometido(a) por autismo.

O transtorno do espectro autista (TEA) se refere a uma série de condições caracterizadas por algum grau de comprometimento no comportamento social, na comunicação e na linguagem, e por uma gama estreita de interesses e atividades que são únicas para o indivíduo e realizadas de forma repetitiva. 

É um problema no desenvolvimento neurológico que prejudica a organização de pensamentos, sentimentos e emoções e tem como características a dificuldade de comunicação por falta de domínio da linguagem e do uso da imaginação, a dificuldade de socialização e o comportamento limitado e repetitivo.

A Lei nº 12.764/2012 (que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista), por sua vez, assegura que a pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.

Como se vê, o autismo é uma doença séria, razão pela qual, em muitas ocasiões, inviabiliza que a pessoa acometida possa inserir-se no mercado de trabalho e prover a sua própria subsistência e da sua família. Tal situação pode conferir o direito, não apenas ao BPC/LOAS, mas ao auxílio-doença e à aposentadoria por invalidez, a depender do fato de o indivíduo ser ou não segurado do INSS.

Imperioso destacar, ainda, que a Lei nº 12.764/2012 é clara ao definir essa enfermidade como uma deficiência.

O ponto chave para que seja concedido o BPC/LOAS a pessoa acometida pelo autismo é o fato de a doença causar limitação no desempenho da atividade e redução na capacidade de inserção social, sendo de extrema importância que os relatórios médicos e multiprofissionais estejam detalhados nesse sentido. Ainda assim, a perícia médica irá analisar a condição do indivíduo e constatar a necessidade de concessão do benefício.

A análise atual da condição de pessoa com deficiência não mais se concentra na incapacidade laboral e na impossibilidade de sustento, mas na existência de restrição capaz de obstaculizar a efetiva participação social de quem o postula de forma plena e justa.

Nesse sentido, inequívoco notar que o autismo é uma doença obstaculiza a inserção do indivíduo no mercado de trabalho, bem como a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições.

Analisando a jurisprudência, podemos observar que tem sido reconhecido o direito à concessão do BPC-LOAS à pessoa portadora de autismo:

E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. LOAS. DEFICIÊNCIA E MISERABILIDADE. AUTISMO. VERBA HONORÁRIA. DIB. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. 1 – Por primeiro, recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual. 2 – O Benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993. 3 – A concessão do benefício assistencial (LOAS) requer o preenchimento concomitante do requisito de deficiência / idade e de miserabilidade. Requisitos legais preenchidos 4 – No que pertine à deficiência, em analise do laudo médico pericial, foi comprovado que a requerente é autista, fato que a incapacita para a vida independente, não restando duvidas sobre a deficiência alegada. 5 – Do cotejo do estudo social, foi constatado que a renda do núcleo familiar é considerada nula, restando evidenciado que a família da requerente não possui condições de prover o seu sustento, ficando perceptível que é precária a condição de vida no que pertine as despesas básicas que garantem a subsistência da família. 6 – No caso, o termo inicial do benefício fica mantido conforme fixado na sentença, em 17/04/2019 data do requerimento administrativo. 7 – Desprovido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, os honorários fixados na sentença devem, no caso, ser majorados em 2%, nos termos do art. 85, parágrafo 11, do CPC/2015, observada a suspensão prevista no artigo 98, parágrafo 3º, da mesma lei. 8 – Apelação do INSS improvida. Sentença mantida.

(TRF-3 – ApCiv: 51003745520214039999 SP, Relator: Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, Data de Julgamento: 01/02/2022, 7ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 09/02/2022)

ASSISTENCIAL. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS. LEI 8.742/91. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. DIB. MULTA INCABÍVEL. 1. Sentença proferida na vigência do novo CPC/2015: não há que se falar em remessa necessária, a teor art. 496, § 3º, I, do novo Código de Processo Civil. 2. O benefício de prestação continuada é devido à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. 3. A família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é capaz de prover de forma digna a manutenção do membro idoso ou portador de deficiência física (§ 3º, art. 20, Lei 8.742/93). Contudo, o legislador não excluiu outras formas de verificação da condição de miserabilidade. Precedentes do STJ, da TNU e desta Corte. 4. O estudo social (fls. 55/57) demonstrou que o núcleo familiar era composto pela parte autora (menor) e seus genitores. A renda auferida pela família advinha do benefício “bolsa família”. Miserabilidade social constatada. 5. A perícia médica (fls. 63/64) constatou a incapacidade da autora (portadora de autismo, distúrbio de atividade e de atenção). 6. DIB: a partir da data do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal. 7. Atrasados: a correção monetária deve observar o novo regramento estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, no julgamento do RE 870.947/SE, no qual fixou o IPCA-E como índice de atualização monetária a ser aplicado a todas as condenações judiciais impostas à Fazenda Pública. Juros moratórios conforme Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. 8. Aplicação de multa diária contra a Fazenda Pública, incabível na espécie. 9. Apelação do INSS parcialmente provida, nos termos dos itens 6 e 8. De ofício, fixar o IPCA-E como índice de correção monetária.

(TRF-1 – AC: 00009384820184019199, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Data de Julgamento: 25/04/2018, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: 28/05/2018)

E M E N T A CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL – BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA – ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REQUISITOS COMPROVADOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. TUTELA ANTECIPADA MANTIDA. I – O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº 10.741/2003. II – O laudo médico-pericial feito em 24.10.2017 (ID – 22138982) atesta que o autor é portador de transtornos globais do desenvolvimento e autismo infantil, desde o nascimento, sem prognóstico favorável quanto à aquisição de funcionalidade. III – A situação apontada pelo perito se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II. IV – O estudo social feito em 09.11.2017 (ID – 22138993) informa que o autor reside com a mãe, Adriely Aparecida da Silva, de 26, o pai, Tiago Aparecido Alves de Brito, de 32, e a irmã Nicolly Heloisa Alves da Silva, de 07, em casa cedida pela avó materna, de alvenaria, em fase de acabamento, contendo três cômodos. As despesas são: água R$ 64,00; energia elétrica R$ 80,00; alimentação R$ 700,00; farmácia R$ 300,00; fraldas R$ 83,00; gás R$ 69,00; telefone móvel R$ 30,00; TV a Cabo R$ 78,00; roupas, sapatos e outros R$ 60,00. A única renda da família advém do trabalho formal do pai do autor, no valor de R$ 1.432,33 (mil e quatrocentos e trinta e dois reais e noventa e três centavos) mensais. V – A consulta ao CNIS (22139064) informa que o pai do autor tem vínculo de trabalho com BIOENERGIA DO BRASIL, desde 02.02.2017, auferindo o valor, à época do estudo social, de R$ 1.496,06 (mil e quatrocentos e noventa e seis reais e seis centavos). VI – A renda familiar per capita é inferior à metade do salário mínimo. VII – Levando-se em consideração as informações do estudo social e as demais condições apresentadas, não justifica o indeferimento do benefício. VIII – A situação é precária e de miserabilidade, dependendo o autor do benefício assistencial que recebe para suprir as necessidades básicas, sem condições de prover o seu sustento com a dignidade exigida pela Constituição Federal. IX – A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE 870.947, em 20/09/2017, ressalvada a possibilidade de, em fase de execução do julgado, operar-se a modulação de efeitos, por força de decisão a ser proferida pelo STF. X – Apelação parcialmente provida. Tutela antecipada mantida.

(TRF-3 – ApCiv: 50883636220194039999 SP, Relator: Desembargador Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, Data de Julgamento: 13/06/2019, 9ª Turma, Data de Publicação: e – DJF3 Judicial 1 DATA: 17/06/2019)

Assim, se você é acometido(a) por autismo e essa doença lhe causa um impedimento a longo prazo, tem sim direito à concessão do benefício de prestação continuada, lembrando também deve estar em situação de vulnerabilidade socioeconômica, a fim de preencher o requisito exigido para além da deficiência.

Por fim, não é preciso ter qualidade de segurado do INSS, tampouco um número mínimo de contribuições.

Portanto, caso você se enquadre no cenário narrado neste artigo e tenha tido seu BPC/LOAS negado pelo INSS, não deixe de procurar um especialista em Direito Previdenciário para buscar reverter essa decisão pela via judicial.

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